Quando do início do estudo de uma nova área do Direito na Universidade sempre, mesmo que brevemente, era abordada a Teoria das Fontes do Direito. Eram elas as fontes materiais e as formais.
Em vista disso, alguns possuíam certa dificuldade para a compreensão da concretude da teoria quando utilizada para explicar, por exemplo, o Direito Civil ou Penal, normas estas que aparentam terem sido “dadas” já prontas à sociedade atual.
Por certo, visualizar toda a trajetória da sociedade desde os primórdios dos tempos para só então compreender como e por que a estrutura jurídica possui determinada forma é tarefa árdua, à qual poucos se dedicam.
Logo, a abordagem à Teoria das Fontes do Direito no presente momento é pertinente, pois todos nós vivenciamos o advento da tecnologia e, por consequência, estamos vivenciando o surgimento de um novo ramo do direito.
A superveniência de novas tecnologias ocasionou tantos efeitos na sociedade a ponto de o parlamentar ser obrigado a legislar, pelo fato de esses efeitos não estarem formalmente inseridos na nossa estrutura jurídica.
Deste modo, os fatos jurídicos antes não regulamentados passam a ser formalmente previstos em lei e, consequentemente, inseridos na complexa estrutura jurídica a qual os outros fatos também estão.
É o que vem acontecendo com o Direito Digital.
Se há 20 anos atrás eram quase que inexistentes normas destinadas exclusivamente ao mundo digital, à utilização da internet, ao tratamento de dados e etc. hoje cada vez mais vemos o surgimento de regulamentações impondo limites e regras ao mundo virtual.
O que é o Direito Digital?
Com a intensificação e pulverização do uso da internet e a quase que transferência total de certos negócios jurídicos para o mundo virtual, surge a necessidade, por parte do Estado, de trazer segurança jurídica para esses novos tipos de relação.
Tratamento, vazamento, furto de dados, e-commerce, crimes eletrônicos, contratos eletrônicos, criptomoedas e assim por diante, são questões só possíveis diante dos avanços trazidos pela tecnologia e que antes eram totalmente desregulamentadas.
O Direito Digital vem, portanto, como um ramo acessório do direito que tem a finalidade de regulamentar as relações dentro do ambiente digital.
O Direito Digital é Um “Ramo Acessório” do Direito?
Há controvérsias doutrinárias no que diz respeito ao fato de o Direito Digital ser um ramo autônomo ou não.
Aqui adotamos o entendimento de que, ao menos por enquanto, o Direito Digital vem como forma de agregar às áreas maiores do Direito.
Dessa forma, quando da concretização de um crime ou relação negocial de caráter civil no ambiente virtual, não há o desprendimento dos ramos tradicionais do direito com a consequente aplicação exclusiva de dispositivos do Direito Digital.
Há, sim, aplicação da legislação concernente ao Direito Digital assessorando outros ramos do direito, como é o caso do Penal ou Civil.
Vê-se que um Crime praticado no âmbito virtual não deixa de ser um fato típico, antijurídico e culpável e tampouco um contrato ao qual se adere de maneira inteiramente virtual não fugirá dos preceitos gerais básicos instituídos pelo Código Civil.
Por regulamentar situações antes existentes no mundo dos fatos e que foram transferidas ao mundo virtual, o Direito Digital, por enquanto, é acessório.
No entanto, há atividades que nascem já na era do mundo virtual e nunca estiveram em outro âmbito que não esse, isto é, com o passar do tempo o Direito Digital terá papel fundamental no ordenamento jurídico.
Adquirindo, assim, o status de ramo autônomo do direito.
Existe um Código do Direito Digital?
Se em outros ramos do Direito possuímos concentração das normas em um código, o mesmo não ocorre com o Direito Digital.
Podemos estar diante de um fenômeno equivalente ao da Consolidação das Leis Trabalhistas, código o qual advém da unificação de várias leis esparsas todas aplicáveis ao Direito Trabalhista e, as quais, com a evolução do Direito, culminaram na CLT.
Portanto, o ramo do Direito Digital, por ser novo não só em termos de Brasil, mas de mundo, possui apenas três legislações brasileiras, estas brevemente abordadas a seguir.
Lei Carolina Dieckmann (Lei n.º 12.737/2012)
A notória Lei Carolina Dieckmann tipificou o delito informático de Invasão de dispositivo informático, enxertando no Código Penal o Art. 154-A.
Bem como inseriu o §1º ao Art. 266, CP trazendo para o tipo a hipótese de interrupção ou perturbação de serviço telemático ou de informação.
Marco Civil da Internet (Lei n.º 12.965/2014)
O Marco Civil da Internet veio estabelecer princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil.
Referida legislação trouxe importantes avanços no que diz respeito a privacidade, direitos e garantias dos usuários da internet, bem como responsabilidade dos provedores no fornecimento de internet, coleta e tratamento de dados dos usuários.
Ainda, sua entrada em vigor trouxe à tona assuntos pouco conhecidos como Neutralidade de Rede e Traffic Shapping, posto que deu início a uma verdadeira guerra entre consumidores, PROCON e provedores de serviço de internet.
Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD (Lei n.º 13.709/2018)
A LGPD dispõe sobre o tratamento de dados pessoais com o objetivo de proteger os direitos fundamentais de liberdade e privacidade, seja no meio digital ou fora dele (Art. 1º, Lei n.º 709/2018).
Com entrada em vigor prevista para agosto de 2020 a Lei Geral de Proteção de Dados fará com que todo e qualquer empreendimento que lide com dados de consumidores tenha que se adequar às suas determinações no que concerne a segurança, sigilo e tratamento de dados, sob pena de sofrer sanções.
Oportunidades Proporcionadas Pelo Direito Digital
Por assessorar a aplicação do direito ao âmbito virtual, o Direito Digital é um ramo do direito que chegou para ficar, já que a Internet permeia quase que todas as relações atuais.
Cabendo aos advogados e escritórios de advocacia se adequarem ou ficarem para trás.
Por ainda ser um ramo com maior ênfase no assessorar de outros ramos do direito, o Direito Digital possibilita a atuação no contencioso, consultivo, criminal, contratual e, com a superveniência da LGPD, o Compliance.
Portanto, devem os profissionais ampliarem seus saberes, atualizando-se de forma a somar aos seus conhecimentos já consolidados as normas trazidas pelas três legislações acima mencionadas.
Os advogados ou escritórios de advocacia que pretendam se inserir na área do direito digital, possuem uma janela de oportunidade para prospecção de clientes em um nicho que cada dia tende a crescer mais e mais.