Crime Continuado, Habitual ou Permanente?

João Carneiro 5 min de leitura

Crime continuado, crime habitual, crime permanente e até mesmo habitualidade criminosa são termos que confundem muitos profissionais do direito.

Isso acontece porque não são apenas as semelhanças entre seus nomes que os aproximam, mas também as consequências que trazem ao mundo jurídico.

Entretanto, quando o profissional do direito se depara com essa questão e vai em busca de respostas rápidas, acaba encontrando conteúdos que abordam o tema de forma prolixa e pouco clara.

Começam na dogmática penal, reconstroem a teoria do delito, falam sobre a natureza jurídica, apresentam as teorias objetivas, subjetivas e se estendem demasiadamente.

Por isso nós decidimos elaborar esse conteúdo para sanar a sua dúvida de uma forma rápida e objetiva!

Portanto, fique conosco até o final e confira a diferença entre os institutos do Crime continuado, habitual e permanente, bem como suas respectivas consequências jurídicas!

Vamos começar!

O que é crime continuado?

O crime continuado é um instituto de política criminal previsto no art. 71 do Código Penal.

Ele foi criado para afastar o apenamento excessivo em desfavor do agente, obedecendo ao princípio constitucional da proporcionalidade da pena.

Isso ocorre porque o instituto do crime continuado cria uma ficção jurídica que une diferentes condutas criminosas e as considera como única em razão das circunstâncias de tempo, lugar e modo de execução.

Ou seja, em vez de responder por diversos delitos acumulados (concurso material), o agente responderá pela pena do crime mais grave aumentada de um percentual.

Para que você compreenda, vamos ao art. 71, veja-se:

Art. 71 – Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços. 

Vamos quebrar esse artigo para podermos entender quando o crime continuado ocorre!

Requisitos do Crime Continuado

Antes de mais nada, para melhor compreensão, nós iremos dividir o art. 71 do CP em 5 partes, sendo cada uma delas um dos requisitos para o crime continuado.

Assim, o crime continuado ocorre quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes:

  1. Crimes da mesma espécie

Entende-se por crimes da mesma espécie aqueles que possuem a mesma tipificação penal. 

  1. Nas mesmas condições de tempo

A jurisprudência pátria consolidou o entendimento de que o tempo entre os delitos não pode extrapolar os 30 dias (STF, HC 107636).

  1. Com identidade de lugar

Aqui falamos de crimes cometidos no mesmo bairro, cidade ou até mesmo em cidades limítrofes. 

  1. Utilizando-se do mesmo modus operandi 

Os crimes devem seguir o mesmo tipo de execução.

  1. E que os crimes subsequentes sejam tidos como continuação do primeiro

Por fim, exige-se que um crime seja uma decorrência lógica do primeiro, de modo que exista a unidade de desígnios.

Agora que você já sabe os requisitos para a aplicação do instituto do crime continuado, que tal apresentarmos um exemplo?

Exemplo de Crime continuado

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDFT) elenca o seguinte exemplo de crime continuado:

Com o objetivo de furtar um faqueiro da patroa, uma empregada doméstica empreende furtos diários para subtrair peça a peça. 120 dias depois termina de furtar todo o faqueiro.

Assim, caso não existisse o instituto do crime continuado, a pena mínima seria de 120 anos de reclusão.

Quais as consequências jurídicas da continuidade delitiva?

As principais consequências jurídicas da continuidade delitiva repercutem junto à pena. 

E isso pode ser visto na parte final do art. 71, no qual consta que quando do crime continuado será aplicada a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada de 1/6 a 2/3.

Inclusive, a jurisprudência consolidou critérios objetivos para aplicação desse aumento, vejamos um fragmento de julgado:

“8.  Esta  Corte  Superior  firmou  a  compreensão de que a fração de aumento no crime continuado é determinada em função da quantidade de delitos  cometidos,  aplicando-se  a  fração  de aumento de 1/6 pela prática  de  2  infrações;  1/5,  para  3  infrações;  1/4,  para  4 infrações; 1/3, para 5 infrações; 1/2, para 6 infrações; e 2/3, para 7  ou  mais infrações (HC 342.475/RN, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Sexta Turma, DJe 23/2/2016).”

Agora podemos falar sobre o Crime Habitual e o Crime Permanente, figuras mais simples que o Crime continuado!

Afinal, o que é Crime Habitual?

Antes de mais nada, o crime habitual é uma classificação que se dá a determinados tipos de crimes que demandam uma habitualidade no seu exercício para a concretização do delito.

Nessa modalidade de crime ocorre uma reiteração de atos que, se considerados individualmente, são indiferentes penais, contudo, se agrupados, constituem um tipo penal.

São exemplos de crimes habituais:

  • Exercício ilegal da medicina (art. 282 do CP);
  • Casa de prostituição (art. 229 do CP);
  • Rufianismo (art. 230 do CP).

Ou seja, há a necessidade de uma pluralidade de condutas de forma habitual por parte do agente para que se concretize o delito.

Ainda, a doutrina aponta ser necessária a demonstração do crime como estilo de vida do agente.

Por fim, por ser apenas uma classificação, o crime habitual não traz grandes repercussões para o mundo jurídico que não a sua mera aplicação.

O que é o Crime Permanente?

De antemão, o crime permanente é aquele que sua prática se estica no tempo, isto é, sua prática é prolongada.

Um exemplo de crime permanente é o sequestro e o cárcere privado (art. 148, CP).

O crime permanente traz algumas consequências para o agente que o pratica, entre elas podemos citar:

  • A contagem da prescrição só se inicia quando cessar a permanência (art. 111, III, do CP).

Ou seja, nos delitos permanentes a contagem da prescrição só começa quando o crime finda.

  • No crime permanente o estado de flagrância permanece enquanto durar a permanência. 

Portanto, o agente pode ser preso em flagrante delito a qualquer momento enquanto durar a permanência do delito.

  • A Súmula 711 do STF determina que “a lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência.”

Assim, tendo início a prática delitiva permanente e ocorrendo a superveniência de lei nova mais gravosa, ela poderá ser aplicada ao agente.

Agora você já sabe as principais diferenças entre os três institutos! Gostou? Confira outros conteúdos do Blog da Bonafide!

Escrito por

João Carneiro

OAB/MS 24.014

Advogado graduado em Direito e Mestre pela Universidade Católica Dom Bosco (UCDB). Redator de conteúdos jurídicos para WEB harmonizados ao SEO.